segunda-feira, 7 de abril de 2008

TG ENTREVISTA: EDUARDO ARDANUY



Uma vez, ao perguntarem o que você fez no passado e que hoje não faria mais, você respondeu que não tocaria mais de graça. É interessante ouvirmos isso de um músico de seu gabarito, pois demonstra que, inclusive para você, as coisas não foram fáceis. Comente um pouco sobre esta fase antes do Dr. Sin, contando um pouco do caminho que você percorreu para chegar até ponto em que está.

No começo é inevitável, o cachê quase sempre é pouco ou até mesmo nada. Faz parte do início da carreira em qualquer profissão onde você começa como estagiário ganhando uma “merreca” por um bom tempo apenas para adquirir experiência. E com o Dr. Sin não foi diferente, apenas com o prestigio que a banda foi adquirindo com o tempo os cachês foram aumentando.

Sabemos que a sua dedicação com a música, e principalmente com a guitarra, sempre foi muito grande. Você estudava várias horas por dia e vivia em função do instrumento. Hoje, como um músico muito mais maduro e com uma vasta experiência como professor, como você acha que deve ser a rotina de estudos de um guitarrista? Como um garoto que está se dedicando ao estudo de música deveria criar seu plano de estudos?

Eu não me considero o cara mais certo para tratar desse assunto, principalmente em relação ao tempo que se deve dedicar a cada coisa. Agora, para qualquer um, música é melodia, harmonia e ritmo. Harmonia é relativa à acordes, progressões, consonâncias e dissonâncias, melodia ta ligado à arpejos e escalas, mas o que é o principal e organiza dando sentido a tudo isso é o ritmo. O músico que não pesquisa ritmos, por mais que ele conheça as escalas, seu som será sempre pobre e infantil.

O comércio de instrumentos e acessórios musicais hoje está cada vez maior. As ofertas e diversidades de produtos são tentadoras e cada dia sonhamos com um equipamento diferente. Ninguém melhor do que você sabe que o verdadeiro som está nas mãos do guitarrista. Quais as dicas que você pode dar ao guitarrista que está formando seu set-up? O que realmente é necessário e o que é supérfluo?

Isso é verdade. Existem muitas soluções para montar um set-up legal. Eu acho que a grande sacada é o cara conhecer bem o som que ele vai tirar com um certo equipamento através de uma pesquisa. É possível encontrar boas soluções sem gastar muito, mas não tem como fugir da situação em que os melhores equipamentos sempre serão os mais caros.

O MP3 e sites como o i-Tune vão acabar com o CD tradicional? Como você vê o futuro para este mercado?

Tem sempre o lado bom e o lado ruim. O lado bom é que você consegue divulgar o seu trabalho por um meio alternativo. Para quem não tem uma gravadora e que não faz o trabalho de divulgação no rádio ou na TV, a internet acaba sendo uma solução. Por outro lado, se você for depender somente da internet, será difícil de alcançar um “algo mais”, pois existem um milhão de bandas fazendo a mesma coisa. Para o artista, a música grátis na internet é prejudicial, já que dificilmente alguém irá comprar um CD sendo que este está a disposição gratuitamente on-line. O cara só vai comprar o CD ou as músicas pela internet se ele for um colecionador.

Por que o Dr. Sin ainda permanece uma banda "underground" em termos de divulgação na mídia? Isso está relacionado com a falta de uma gravadora?

Com certeza, o único disco que agente realmente trabalhou com uma gravadora forte (Warner) foi o primeiro. Fizemos alguns contatos internacionais e a banda começou a acontecer do dia pra noite. Grandes festivais, CD gravado em Nova York, Clipes na MTV e as músicas tocavam com uma certa freqüência nas rádios. Como o CD não obteve a venda que gravadora esperava eles nos deram duas opções: mudar o estilo da banda ou perder tudo. Foi então que agente começou a produzir o nosso próprio trabalho, o que acabou nos limitando, porque lançar uma música no rádio ou na TV é essencial mas muito caro. Talvez por este motivo o DR. Sin tenha se tornado uma banda “underground”.

O Dr Sin, como muitas outras bandas e artistas, já lançou um CD independente. Vemos que cada vez mais os músicos aderem a este tipo de distribuição de CD. Você acha que as grandes gravadoras estão perdendo espaço graças a esta iniciativa? Vale a pena lança um CD para ser comercializado em banca de jornais?

É uma solução difícil, pois como havia dito antes é muito caro produzir um CD, e se não houver uma boa divulgação na mídia, dificilmente as coisas vão dar certo. Neste ponto é que as gravadoras se tornam um mal necessário, porque se você não é filho de um milionário ou já é famoso como artista, não vai ter dinheiro para produzir o seu próprio trabalho.

Depois da gravação do CD e DVD “Dr Sin ao Vivo 10 anos” é impossível não observamos o crescimento da banda. O Dr Sin, como uma banda que já está a muitos anos na estrada conhece muito bem os altos e baixos da carreira de um grupo musical. Como você vê o cenário musical no Brasil atualmente, não só para o rock, mas também para música instrumental, jazz, blues e outros gêneros que não recebem tanto apoio das gravadoras?

Com certeza ainda é bem difícil, o que acaba salvando são os workshops que são bem mais baratos que um show e por isso acaba gerando algum lucro. Lógico que toda regra tem exceção, com certeza existe um grupo de Jazz ou Rock que acaba fazendo vários shows e conseguem se manter no mercado, mas isso é raro.

Você mencionou, em uma entrevista, que fica impressionado com a performance do guitarrista Mattias Uklundh (Freak Kitchen). Por quê? Existem outros músicos da atualidade que te inspiram?

Com certeza. Todo músico que toca bem e de forma original me influencia do dia pra noite. O que me impressionou muito no jeito dele foi, a princípio, sua técnica absurda, pelo menos em CD, já que ouvi muita poucas coisas dele ao vivo. O principal é que ele é original, item que anda faltando nos dias de hoje. Se você chacoalhar uma árvore cai 4 virtuosos, e todos iguais soando como Malmsteen, Steve Vai ou John Petrucci (risos) Coloco minhas mãos no fogo se isso não for verdade! Hoje em dia não dá mais para ficar escutando a cópia da cópia da cópia. Se eu quiser ouvir Steve Vai eu compro o CD dele e não o CD de um garoto que parece com eles. O genial de um artista é a sua composição, se o garoto não tem isso em mente ele pode até enganar em um curto prazo, mas há longo prazo em relação a construir uma carreira em cima desse blefe mais cedo ou mais tarde a mascara cai.

E você acha que isso ta ligado ao fato de que hoje em dia, ao contrário do que foi nos anos 80, está na moda criticar a figura do guitarrista virtuoso. Como você aborda essa questão?

Sim, isso acaba dando aquela impressão de que guitarrista virtuoso é um “mala”, o que é uma ignorância. Se o cara não gosta de música virtuosa não quer dizer que a música seja ruim, é muito complicado criticar a genialidade de Steve Vai ou Allan Holdsworth.

Fale sobre o que é a música para você deixando um recado aos fãs e guitarristas em geral que visitam o Tocando Guitarra.

Música é a única forma que eu tenho de me expressar, não conheço outra em que eu me sentiria bem. Só escutar música pra mim não basta, eu realmente preciso fazer música. Se um dia eu não puder mais fazer música com certeza eu serei o cara mais deprimido do mundo! (risos) . E pra galera do Tocando Guitarra a mensagem que eu gostaria de deixar é: sempre busque algo novo, um diferencial. Ser obcecado por um artista acaba levando à cópia. Por isso, tente ser mais eclético ouvir e se inspirando em novos sons e novos artistas, o que, com certeza, o ajudará muito.

Entrevista: Rodrigo Almeida e Tomaz Gomes